Hoje, 6 de dezembro de 2024, realizou-se no Parlamento português a sessão solene comemorativa do centenário do nascimento de Mário Soares.
Quem me conhece sabe que nunca fui militante de nenhum
partido, nem estive perto do meio político. O mais próximo que, a espaços,
cheguei, foi a convivência com alguns conhecidos ou amigos que gravitavam nesse
meio. Mesmo nessas circunstâncias, sempre assumi uma atitude passiva, guardando
para mim as opiniões que tinha, como qualquer comum mortal, arredado dessas
lides políticas.
Se fosse José Rentes de Carvalho, diria “dai-me raivas”, mas
prefiro dizer que o que vou escrever a seguir representa o meu direito à
indignação, que se manifesta num sentimento de profunda tristeza.
Como nesta altura em Moçambique temos uma diferença de duas
horas para Portugal, quando acabo de almoçar, tenho o hábito de ligar o
televisor, e ver um dos canais noticiosos da TV portuguesa no seu jornal do
meio-dia. Quando o fiz hoje, nem me ocorreu o que estava a acontecer na
Assembleia da República e que evoquei nas primeiras linhas deste texto.
Estava a usar da palavra o Presidente da Assembleia,
enaltecendo, e bem, todo o contributo que Mário Soares deu para aquilo que hoje
é Portugal. Confesso que a eloquência do discurso, verdadeira e factual, me
emocionou, transportando-me há muitos anos atrás quando era um jovem à procura
do seu caminho.
Pese embora não ter estado sempre de acordo com as ideias e
opções políticas de Mário Soares, reconheço-lhe o imenso mérito na construção
da democracia portuguesa, que não sendo perfeita, deve ser motivo de orgulho
para todos os portugueses.
Talvez me encontre agora mais sensível há liberdade que vivi
desde os meus dezasseis anos, por viver num país que teve a presença portuguesa
durante quase cinco séculos, e que de democracia apenas tem a que a palavra
Républica pode encerrar no seu propósito.
Mas voltando à sessão parlamentar, seguiu-se a alocução do
Presidente da Républica que, apesar de assertiva, não teve brilho face ao
orador que o antecedeu. Não tive oportunidade de ouvir os discursos dos líderes
parlamentares dos partidos representados na Assembleia, que tiveram lugar antes
de ligar o televisor. Ouvi sim, a opinião dos comentadores políticos, que de
uma maneira geral enalteceram o tom elevado com que todos se referiram a Mário
Soares. Todavia, como não podia deixar de ser, o Chega, ainda que numa rara
tentativa de ser respeitoso, teve que ser impreciso e encontrar algo negativo a
quem estava a ser homenageado e tanto fez para que se pudessem sentar nos
lugares de ocupam no Parlamento.
Mas a minha tristeza não advém do que o André Ventura
proferiu no seu discurso, que não escutei. Vem sim da atitude indigna de se
manterem sentados, enquanto os deputados presentes aplaudiam, de pé, as
alocuções dos dois presidentes.
Este líder do Chega, que de líder tem tanto como um pastor
que conduz as suas ovelhas, sem querer ofender, obviamente, o pastor e o
rebanho, não sabia sequer que algum dia ia existir, quando Mário Soares e
outros democratas da época do 25 de abril, faziam política “à séria”.
O respeito pela história, e por aqueles que a fizeram, deve
ser um valor indiscutível numa sociedade justa e democrática. Só espero e
desejo, que esta mesma história, seja capaz de devolver estes sem vergonha ao
seu lugar, limpando um parlamento aonde se sentaram pessoas como Mário Soares.
Como gosto de provérbios, só espero que o seguinte se
aplique ao que acabei de afirmar: “os cães ladram, e a caravana passa”.
"A vida é
sempre curta. O que é preciso é que a gente viva com dignidade e deixe uma
memória simpática do que fez."
Mário Soares (político
português)
Parabéns pelo texto que assenta como uma luva no contexto presente. Há gente, gentinha, que não deixará marcas dignas de nota, (as boas).
ResponderEliminarLamento, como dizes,
Obrigado Faustino, pelo teu comentário, e por frequentares este meu espaço de partilha de opinião. Espero continuar a contar com a tua presença e o teu feedback.
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