segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

CHEGA, DE VERGONHA

Coloquei propositadamente a virgula no título desta crónica. Mas, poderia intitulá-la eliminando a virgula. “Chega de vergonha”, ou o mesmo será dizer a vergonha do Chega.

Na passada sexta-feira, 29 de novembro de 2024, o ex-primeiro ministro de Portugal António Costa, tomou posse de um dos cargos mais importantes e prestigiados da política europeia – Presidente do Conselho Europeu. Esperava-se que esta fosse a notícia de maior destaque nos jornais televisivos da noite, após a inexplicável abertura destes serviços informativos, dois dias antes, pelo atual primeiro-ministro Luis Montenegro, que se dirigiu aos portugueses como se estes fossem meninos na instrução primária. Com efeito, espantosamente, foi o Chega, com o seu grupo de deputados arruaceiros, que maior destaque teve nas notícias do dia.

As surpresas da política portuguesa sempre ocorrem em momentos que ofuscam o que, de facto, é relevante. Foi o caso desta sexta-feira, com o Chega como protagonista. Cometendo aquilo que muitos consideram como crime, que do ponto de vista legal não sei avaliar, mas que ética e moralmente considero reprovável e inaceitável, os deputados deste partido (assim lhe chamam) penduraram faixas nas janelas do parlamento, com montagens de fotografias de líderes políticos, protestando contra o fim do corte de 5% nos vencimentos dos titulares de cargos políticos. Isto impediu o arranque da discussão do orçamento para 2025 no semicírculo da Assembleia, tendo o presidente necessidade de pedir a intervenção dos bombeiros para a retirada das faixas pelo exterior.

Não satisfeitos com este espetáculo degradante, os deputados do Chega levantaram cartazes com a mensagem "Este parlamento perdeu a vergonha", no momento em que o presidente da Assembleia anunciava a aprovação do orçamento.

Estes atos do Chega na Assembleia da República, segundo alguns comentadores, podem ser juridicamente considerados como uma forma de protesto político, protegido pelo direito à liberdade de expressão e manifestação. Porém, outros defendem que se trata de atos classificados como desordem e perturbação da ordem pública, de acordo com as regras e regulamentos internos da Assembleia da República. Embora não tenha dúvidas de que o Ministério Público irá investigar esta situação, temo que possa não existir forma de legalmente condenar estes comportamentos, por não se encontrarem previstos nos regulamentos que gerem a atuação dos deputados.

A ausência de regulamentação para estas ocorrências, resulta da existência de um pensamento democrático que parte do princípio de que seria impensável que este tipo de atos acontecessem. Efetivamente, não podemos criticar o legislador, que se materializa na própria Assembleia da República, constituída por deputados eleitos pelo povo. Lamentável é que uma parcela deste povo, os eleitores do Chega, atentem, de forma involuntária e inconsciente, contra um estado democrático com meio século de existência, ao elegerem estes vândalos engravatados para os representarem no nosso parlamento.

Sem desmerecer da importância do julgamento e respetiva punição no âmbito jurídico, deste comportamento degradante e inaceitável, numa democracia com cinquenta anos de existência, que no início desta mesma semana recordava os acontecimentos do dia 25 de novembro de 1975, preocupa-me a falta de dignidade presente neste grupo parlamentar, com principal relevância e evidência no seu líder, André Ventura.

Que me perdoem os seus pais, pois a realidade neste caso é dolorosa, mas eu teria vergonha deste filho, mesmo que a sua conceção tivesse resultado de um acidente. Falo sem “papas na língua”, dado que sou pai de um único filho, mais velho um ano que este individuo. Apesar de todos os meus esforços, sem sucesso, tenho procurado sensibilizá-lo para que cumpra um dos seus deveres cívicos, o direito de voto, ao qual sempre renunciou, por não confiar na nossa classe política.

Creio que o recente sucesso eleitoral do Chega se consubstancia na mesma génese, mas resultante de um comportamento contrário ao do meu filho que, um pouco irresponsavelmente, vira as costas ao mundo e deixa andar. Tal como noutros países europeus, em que o crescimento de movimentos políticos ligados à extrema-direita é uma realidade, este partido encontrou um espaço no cenário político português em que a promessa vale mais do que a ação. Assim, André Ventura tem conquistado uma turma eleitoral de insatisfeitos, desiludidos e preguiçosos que acreditam que com insolência e voz grossa se resolve tudo.

Pena é que desconheçam, ou se tenham esquecido, do que António Oliveira Salazar dizia sobre a educação. Sem dúvida que é uma arma muito perigosa, quando pretendemos dominar um povo através da opressão e da ignorância. Contudo, é essencial para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária, algo que não passa pelos ideais do líder do Chega.

Termino, dizendo ao André Ventura, como se fosse meu filho (salvo seja): “Vê se és mais educado, e ganhas vergonha na cara!”


"A vergonha é a cicatriz que a moralidade deixa na alma."

Friedrich Nietzsche (filósofo, poeta e compositor prussiano)

 


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