Francisco partiu de consciência tranquila, pois num mundo caótico como aquele em que vivemos hoje, nada mais poderia ter feito. Todavia, despediu-se da vida com a inquietude de quem deixa uma missão a meio, talvez impossível de finalizar, mesmo que os dons divinos o tornassem imortal.
O Papa Francisco, ou o Padre Jorge, como gostava que o tratassem,
nasceu em Buenos Aires a 17 de dezembro de 1936, tendo sido batizado com o nome
de Jorge Mario Bergoglio. Descendente de uma família de imigrantes
italianos, o seu pai era um trabalhador ferroviário e a sua
mãe dona de casa. Praticou basquetebol no San Lorenzo, um
dos cinco grandes do futebol argentino e cujas origens haviam sido
impulsionadas por um padre. Torcedor sanlorencista
assumido, afirmou que não perdeu nenhum jogo do título
argentino de 1946, quando tinha então dez anos.
Nascido e criado no bairro de Flores, atual sede
do San Lorenzo, o Papa Francisco era o mais velho de cinco filhos. Tinha
formação como técnico de química pela Escuela Técnica Industrial N° 27 Hipólito
Yrigoyen. Ainda jovem, teve uma doença respiratória que o obrigou a
submeter-se a uma cirurgia de remoção de um pulmão. Durante a sua adolescência,
teve uma namorada chamada Amalia que, segundo ela, a terá chegado a pedir em
casamento e afirmado que se ela não aceitasse se tornaria padre.
Foi o primeiro papa nascido na América, o primeiro
pontífice do hemisfério sul, o primeiro papa a utilizar o nome de Francisco, o
primeiro pontífice não europeu em mais de 1 200 anos e também o
primeiro papa jesuíta da história. Tornou-se arcebispo de Buenos
Aires em 28 de fevereiro de 1998 e foi elevado ao cardinalato em
21 de fevereiro de 2001. Foi eleito papa em 13 de março de 2013.
Ao longo de toda a sua vida pública, o Papa Francisco destacou-se
pela sua humildade. Tinha uma abordagem menos formal ao papado do que os seus
antecessores, escolhendo residir na casa de hóspedes Domus Sanctae
Marthae, em vez de nos aposentos papais do Palácio Apostólico, usados
pelos papas anteriores. Ele sustentava que a Igreja deve ser mais aberta e
acolhedora, colocando ênfase na misericórdia de Deus, na preocupação com os
pobres e no compromisso com o diálogo inter-religioso. Era contra
o capitalismo desenfreado, o marxismo e versões
da teologia da libertação. Mantinha as visões tradicionais da Igreja em
relação ao aborto, casamento, ordenação de mulheres
e celibato clerical.
Na diplomacia internacional, ajudou a restaurar
temporariamente as relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Cuba e
apoiava a causa dos refugiados das crises migratórias da Europa e da América
Central. Enfrentou críticas abertas, particularmente de conservadores
teológicos, sobre muitas questões. Defendeu acerrimamente o combate de abusos
sexuais por membros do clero, tornando obrigatórias as denúncias e
responsabilizando quem as omite.
Manteve o sorriso e o bom humor que o caracterizava até ao
último suspiro. Com enormes dificuldades respiratórias pela enfermidade que o tinha
mantido internado muitos dias, trabalhou ainda no dia em faleceu, tendo na
véspera, Domingo de Páscoa, aparecido no meio dos fiéis na Praça de São Pedro.
Foram respeitadas as suas vontades quanto à forma como
pretendia ser sepultado e o caixão em que o seu corpo devia ser depositado.
Decerto teria vontade de fazer como o Pinto da Costa, e nomear os que não
queria ter no seu funeral. Tenho a certeza que o pensou, e teria muito bem
identificadas essas pessoas. Mas mesmo que o pudesse fazer, nunca o faria, pois
era o representante máximo da Igreja, instituição que sempre defendeu ser de
TODOS e TODOS acolher.
Assisti, pela televisão, aos momentos mais marcantes das exéquias
e de todo o cerimonial que as envolveram. Não pelo sentido religioso, mas pela
perda de um homem bom que soube usar o poder que lhe foi conferido, senti algumas
lágrimas rolarem no meu rosto. Em contraste, fui por vezes invadido por um
sentimento de revolta por aquilo que presenciava no espaço reservado aos
convidados de honra. Que hipocrisia! Para completar tão “ilustre” plateia só
faltaram Putin e Netanyahu. É evidente que no meio de tantos farsolas estava
gente de bem, como Guterres e uns tantos outros.
Adeus, Francisco! Obrigado por todo o teu esforço de
tentares construir um Mundo melhor, que o Homem não quis e não soube
aproveitar.
"A hipocrisia é
uma homenagem que o vício presta à virtude."
François de La Rochefoucauld (escritor e
moralista francês)

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