Uma das atividades que exerço profissionalmente é a formação profissional. Inicialmente, a temática que mais desenvolvi foi associada à área comercial, com principal incidência nas vendas e na negociação. Neste último domínio, evoluí para um âmbito mais amplo, e não estritamente focado nas transações mercantilistas. Em boa verdade, não nos apercebemos da quantidade de negociações que fazemos diariamente, muitas delas dando suporte às decisões que quotidianamente temos necessidade de tomar.
Este preambulo foi apenas para enquadrar o título desta
crónica, pois é a denominação de uma estratégia ou técnica negocial.
Visualmente, consiste em irmos retirando fatias finíssimas de um salame, de
forma que ninguém dê conta que ele vai diminuindo e nós apropriando-nos
lentamente do seu todo. Esta técnica é muito usada quando estamos em presença
de opositores que têm dificuldade em ceder partes significativas do seu
espólio, mas que não são muito observadores e paulatinamente vão vendo o seu
património ser reduzido, mas sem se darem conta do que está a acontecer.
Lembrei-me desta técnica negocial, enquanto refletia sobre a
estratégia do Chega nas eleições de domingo. Aqueles que como eu eram adolescentes
ou jovens em 1974, quando se deu o 25 de abril, pensam, talvez ingenuamente,
que a possibilidade de um partido de extrema-direita governar Portugal é pura
ficção. Mas se ainda não tínhamos dado conta de que estávamos enganados, depois
do que ontem se passou com os resultados eleitorais das legislativas 2025, não
temos mais desculpa para continuarmos a fazer como a avestruz, e metermos a
cabeça debaixo da areia.
Em apenas seis anos, o Chega, chegou viu e venceu. Não
venceu ainda estas eleições, mas, se não abrirmos os olhos, irá ganhar as
próximas eleições. Basta continuarmos a manter a atitude arrogante bem patente
em políticos como o Nuno Melo, que julga que está na tropa e pensa que a
antiguidade é um posto. Recordo-me de que no debate com o Livre, em que se
sentiu ofendido por o Rui Tavares ter indigitado Isabel Mendes Lopes para
representar o grupo parlamentar, ter referido que o CDS era um partido que
fazia parte da história da democracia portuguesa, com cinquenta anos de
existência, enquanto o Livre era apenas um adolescente com dez anos de vida.
Pois ao Chega bastou apenas chegar à idade pré-escolar para ser a segunda força
política nacional, e conquistar vinte e seis por cento dos lugares na
Assembleia da Républica.
Pode ser que o Rui Tavares, que é licenciado em História, estimulado
por ter conseguido mais dois deputados do que nas eleições anteriores, comece a
realizar uns workshops pós-laborais para os nossos líderes políticos, explicando
como a Républica derrotou a Monarquia, a Anarquia se instalou na Républica, o
Fascismo limpou a Anarquia, a Democracia venceu o Fascismo, e o Totalitarismo e
a Extrema-direita estão a exterminar a Democracia. Seja através dos ideais imperialistas
de Putin, do fanatismo de Netanyahu ou da ambição desmedida de Trump, não
faltam alertas para que não nos deixemos adormecer, despertando quando já
estivermos manietados.
É preciso oferecer soluções de vida aos eleitores, colocar a
causa pública acima dos interesses pessoais, e mostrar maturidade para inspirar
confiança. Não chega caluniar um alvo, quando outros mais espertos, nos metem
no mesmo saco para apanharmos a boleia daqueles que pretendemos denegrir. Foi o
que o Chega fez com o PS, temperando o prato com a exploração de ódios sociais
e a fragilidade da saúde, que só não sortiu mais efeito pela irreverência do
André Ventura, e de ter tido a sorte de não se cruzar com nenhum cigano no
hospital. Sim, porque não existisse esse risco, ele teria recusado o privilégio
de tratamento VIP, pois quem é humilde e vive numa casa de 30 m2,
não precisa dessas mordomias.
Espero que a AD não se deslumbre, como aconteceu no domingo
com o Sebastião Bugalho na CNN. Esquecendo-se como chegou à política, culpou a
comunicação social pelo excessivo destaque informativo que deram aos partidos
de esquerda. É caso para dizer, que mesmo não tendo tido qualquer efeito
eleitoralista, há que manter o discurso do queixoso, pois quem não chora não
mama. E mesmo assim, a mama está a acabar, como o André Ventura disse no seu
discurso de vitória.
Cuidemos e olhemos pelo nosso salame, senão, um dia destes,
quando nos formos servir encontramos apenas o sítio aonde o deixamos.
"A negociação
bem-sucedida é aquela em que o outro lado cede sem perceber que está
cedendo."
Henry Kissinger (diplomata,
cientista político e estratega estado-unidense)
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