Esta expressão popular, "Os últimos serão os primeiros" tem origem bíblica e aparece em diversos trechos do Novo Testamento, refletindo um princípio espiritual ensinado por Jesus, e enfatizando que no Reino de Deus a lógica humana de mérito e posição social não se aplica.
Um dos contextos em que essa frase aparece é na Parábola dos
Trabalhadores da Vinha (Mateus 20:1-15), onde um proprietário contrata
trabalhadores ao longo do dia e, no final, paga a todos o mesmo valor,
independentemente do tempo trabalhado, gerando insatisfação entre os primeiros
contratados. Jesus usou essa história para ilustrar a graça divina, que não se
baseia em esforço humano, mas na generosidade de Deus.
Além do contexto religioso, a expressão também é usada de
forma figurada para indicar que aqueles que inicialmente parecem estar em
desvantagem podem, no final, alcançar posições de destaque. Por exemplo, na
filosofia essa ideia pode ser relacionada com o conceito de justiça reversa ou compensação
moral, onde aqueles que foram negligenciados ou injustiçados podem, em algum
momento, alcançar reconhecimento. Esse pensamento está presente em diversas
reflexões sobre mérito e destino, em obras de pensadores como Pascal e
Nietzsche.
Ao longo da história, muitos indivíduos começaram como
"últimos" e acabaram tornando-se figuras essenciais. Um bom exemplo é
Abraham Lincoln, que teve uma infância humilde antes de se tornar presidente
dos EUA. Outro exemplo é Joana d’Arc, que passou de uma simples camponesa a
líder militar e símbolo nacional.
A expressão também pode ser interpretada no contexto do
esforço humano e da resiliência. Pessoas que enfrentam dificuldades podem
desenvolver habilidades e força que as impulsionam além daqueles que começaram
com vantagens. Essa visão é frequentemente explorada em histórias de superação.
Muitos filmes, livros e histórias usam essa ideia como tema central. Narrativas
de personagens que começam como desfavorecidos, mas superam obstáculos para se
tornarem protagonistas, são comuns na literatura e no cinema, como nas histórias
d’O Conde de Monte Cristo ou do Rocky.
Mas a prosa já vai longa e ainda não expliquei porque é que
esta expressão me veio à mente. Ocorreu-me por contraposição do significado da
mesma, quando refletia acerca das sondagens que têm sido tornadas públicas,
sobre as eleições legislativas antecipadas que decorrerão no próximo domingo em
Portugal, dia 18 de maio de 2025. Penso que neste caso, dos partidos atualmente
com assento parlamentar, os últimos serão mesmo os últimos.
Refiro-me ao PAN e à sua ideia peregrina de estabelecer uma
rede pública de serviços médico-veterinários (SNS Animal), através da criação
ou construção de Hospitais Veterinários Públicos. Quem me conhece bem sabe da
relação que tenho com os animais de estimação, tendo atualmente um companheiro
peludo, o Spock, um felino gato africano, preto e branco, muito meigo e
brincalhão. Porém, parece-me não ser uma prioridade, até porque não entendo
muito bem como se faria o recenseamento animal.
Não imagino que um partido que defende também o direito de
voto aos 16 anos, pense numa medida destas apenas para animais adotados, cujos
donos possam realizar o registo dos seus bichanos no SNS Animal. Então o que
seria de todos os restantes animais “livres”, ditos vadios, que deambulam pelos
bairros das nossas povoações? Ganhariam o estatuto de “sem abrigo animal”, ou
de “imigrantes animais ilegais”, com a possibilidade de serem deportados para a
Animalândia, um país imaginário e distante, com uma realidade urbana distópica
aonde se comeriam uns aos outros?
Sei que chegados a este ponto poderei estar a ser insultado,
no mínimo, como idiota, expressão que virou a insulto nos Big Brothers,
e no uso quotidiano, sendo empregado de forma pejorativa para indicar alguém
tolo, imprudente ou que age sem reflexão, esquecendo-se, no tempo, a sua origem
no grego idiṓtēs, que se referia a um indivíduo que não participava da
vida pública, ou seja, alguém afastado das questões sociais e políticas.
Mas deixemos as questões etimológicas, para irmos até outro partido
político, que garantidamente não ficará em último, mas também não será
primeiro. Refiro-me ao Chega, e aos afrontamentos, que ainda não chegaram a
enfrentamentos, com a comunidade cigana nos locais por onde tem passado a
caravana em campanha eleitoral. Sem retirar algum detalhe em que André Ventura
possa ter alguma razão fundamentada, será que os benefícios que ele aponta em
que esta comunidade é favorecida, são exclusivos deste grupo? Não será mesmo
uma atitude racista e de perseguição? Bem sei que um partido que defende uma
democracia ampla, em que todos paguem, mesmo que não utilizem, como é o caso da
medida de abolição das portagens, não pode ser considerado segregacionista e discriminador.
Sim, agora assumo que estou a ser irónico, propositadamente.
A escolha que nós, portugueses, temos de fazer no próximo
domingo é difícil. Para além destes dois partidos de que falei, temos dois que
apenas defendem uma pequena parcela dos trabalhadores que compõem o eleitorado
nacional, cerca de um décimo. Refiro-me ao BE e à CDU. Outros dois partidos, o
Livre e a IL, pretendem aportar novas ideias, mas sem provas dadas sobre a sua
governabilidade. Restam-nos os dois maiores. Um que se gaba de ter posto a CP a
dar lucro e a ser campeã de greves, e um Luis que pede que o deixem trabalhar,
mas que não sabemos que se tal lhe consentirmos, terá tempo para governar o
país.
Neste balanço, parece-me mais adequado terminar com uma
outra expressão popular, diferente da que deu título a esta crónica. “Entre mortos
e feridos, alguém há de escapar.”
"A política é a
arte de captar em proveito próprio a paixão dos outros."
Henry
de Montherlant (escritor, ensaísta e dramaturgo francês)
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