Moscovo, 3 de novembro de 1957.
Ainda era
madrugada quando a cidade acordou com a notícia: uma cadela tinha sido
enviada ao espaço. Chamava-se Laika. Não tinha pedigree, nem nome de
estrela. Fora recolhida das ruas, uma entre tantas, e treinada para um destino
que nenhum ser vivo conhecia.
No centro de
controlo, os engenheiros observavam os monitores com olhos fixos e mãos
trémulas. O Sputnik 2 cortava o céu, levando consigo não apenas tecnologia, mas
uma vida. Laika não sabia que era pioneira. Não sabia que o mundo a olhava.
Respirava com esforço, o coração acelerado, o corpo preso num habitáculo
metálico. Mas os olhos, dizem os que a viram antes do lançamento, estavam
calmos.
Lá em cima, a
Terra girava sob ela. Azul, redonda, indiferente. Laika não voltou. Mas também
não caiu. Ficou em órbita da memória humana, como símbolo de um tempo em que o
progresso corria mais depressa do que a compaixão.
Nenhuma
estátua lhe devolve o calor do corpo. Nenhuma medalha lhe devolve o chão. Mas
há vitórias que não se medem em regresso. Laika venceu, não porque sobreviveu,
mas porque foi.
E nesse gesto, a razão humana foi confrontada com a sua própria sombra.

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